Tanto homens quanto mulheres relatam há muito tempo que a cannabis altera sua experiência sexual. Em um ensaio publicado em 1971, o astrônomo Carl Sagan, um usuário de maconha de longa data, escreveu que a cannabis “aumenta o prazer do sexo” e “dá uma sensibilidade requintada”.
Há pouquíssimas pesquisas sobre cannabis e libido, no entanto, em parte porque o estudo da maconha tem sido notoriamente difícil de financiar e continua sendo uma droga ilegal de acordo com as leis federais nos Estados Unidos. A maior parte dos levantamentos que existe se baseia em dados de questionários, que são fortemente direcionados a pessoas que já usam cannabis e não são representativas da população em geral, dificultando a obtenção de conclusões firmes. Além disso, as pesquisas não fornecem informações confiáveis e precisas sobre dosagem, método de entrega ou tempo.
Mas com base nas evidências limitadas, a droga parece melhorar a experiência sexual entre muitas mulheres que já a usam.
— Já tive vários pacientes que vieram até mim e disseram: ‘Tenho baixa libido. Pode me ajudar? E, a propósito, se eu usar maconha, posso atingir o orgasmo, sem problemas — disse a Becky Lynn, especialista em medicina sexual e menopausa e fundadora da Evora Women’s Health em St. Louis. — Eles também me dizem que a baixa libido melhora com a maconha.
Lynn, que também leciona na Escola de Medicina da Universidade de Saint Louis, é a principal autora de um estudo publicado em 2019, envolvendo 373 mulheres, que pesquisou sobre cannabis em uma clínica de obstetrícia e ginecologia no Missouri. Destas, 34% relataram ter usado maconha antes da atividade sexual e a maioria deles disse que resultou em aumento do desejo sexual, melhora do orgasmo e diminuição da dor.
Estudos também descobriram que algumas mulheres usam cannabis para ajudar a controlar os sintomas da menopausa, como ondas de calor, suores noturnos, insônia e alterações vaginais, como secura, que podem contribuir para diminuir a libido quando não tratadas.
Além disso, uma pesquisa online com mais de 200 mulheres e homens que usam cannabis descobriu que quase 60% disseram que a substância aumentou seu desejo por sexo; quase 74% relataram aumento da satisfação sexual. Mas o estudo, conduzido por pesquisadores no Canadá e publicado no The Journal of Sexual Medicine, também disse que 16% relataram que o sexo era melhor em alguns aspectos e pior em outros, e um pouco menos de 5% disseram que era pior.
A pesquisa sobre o uso de cannabis e a função sexual entre os homens também é escassa e pode ser contraditória. De acordo com a Sociedade Internacional de Medicina Sexual, alguns homens relatam que seu desempenho sexual melhora quando usam maconha, enquanto outros podem apresentar problemas como menos motivação para o sexo, disfunção erétil, dificuldade para atingir o orgasmo ou ejaculação precoce. O uso de cannabis também foi associado a reduções na contagem, concentração, motilidade e viabilidade de espermatozóides.
‘Comece com pouco e vá devagar’
Todas as drogas têm riscos e efeitos colaterais potenciais, incluindo a cannabis.
Peter Grinspoon, médico de cuidados primários do Massachusetts General Hospital Chelsea HealthCare Center e consultor de cannabis medicinal, aconselhou consumir pouco se você é novo nisso — em alguns casos, apenas 1 miligrama de THC, o principal ingrediente psicoativo da erva — antes de subir lentamente.
— Em doses baixas, a cannabis ajuda a libido, mas em doses altas, muitas vezes não é tão eficaz — disse ele, acrescentando que a quantidade errada pode levar algumas pessoas a ficarem paranoicas e ansiosas. A droga também poderia inibir o orgasmo, criando o efeito oposto ao pretendido.
Lynn concordou:
“Comece devagar e vá devagar”, disse ela.
Quanto é maconha demais? Isso vai variar de pessoa para pessoa.
E como a cannabis é conhecida por prejudicar o julgamento, a coordenação e o tempo de reação, aqueles que usam drogas psicoativas antes ou durante o sexo “devem levar em consideração se as pessoas que usam o produto e seus parceiros podem ter sexo seguro e consensual”, disse a Stacy Tessler Lindau, ginecologista da Universidade de Medicina de Chicago e criadora do WomanLab, um site sobre saúde sexual.
Dado que a cannabis pode comprometer o julgamento sobre a contracepção ou a capacidade de consentir, ela acrescentou, as mulheres podem evitar produtos com componentes psicoativos ou, se quiserem usá-los, aumentar a segurança fazendo sexo com um parceiro de confiança.
O Jordan Tishler, ex-médico de medicina de emergência e presidente da Association of Cannabinoid Specialists, recomendou experimentar maconha sozinha pelas primeiras vezes e se masturbar, para “entender o que ela faz com o corpo e as sensações”.
Qual é o melhor método de entrega de cannabis?
Fumar maconha ou usar canetas vape de óleo devem ser evitados, porque podem prejudicar os pulmões, disseram os especialistas.
Lynn normalmente recomenda tinturas, que são extratos concentrados de cannabis que são tomados por via oral. É fácil medir o número de miligramas que você deseja usar, disse ela.
Tishler geralmente aconselha seus clientes a começar com 5 mg de THC. Dar uma tragada em um vaporizador de flores de cannabis antes de ter uma experiência sexual pode funcionar mais rápido e de forma mais previsível do que comestíveis ou lubrificantes infundidos com THC, disse ele.
— Eu ensino os pacientes a dar uma tragada de uma maneira particular. Uma inalação muito profunda e lenta que nos permite estimar a quantidade de dose que eles estão recebendo.
Lembre-se que a libido é complicada
Existem vários fatores que podem afetar o desejo sexual e a função sexual de alguém, alguns dos quais podem ser abordados por meio de uma consulta com um médico ou um profissional de saúde mental.
Se uma mulher tivesse dor durante a relação sexual, por exemplo, ela precisaria ser encaminhada a um ginecologista para uma avaliação completa, disse Grinspoon. A cannabis poderia ajudar, mas haveria mais a investigar e considerar em qualquer pessoa que esteja experimentando sintomas físicos desconfortáveis.
— Você pode tratar o sintoma enquanto observa a causa subjacente — disse ele. — Não é mutuamente exclusivo.
O GLOBO